Friday, December 25, 2015

[o tempo de um fósforo]

Um dia serás livro. 
Terás uma bela capa dura, macia, cantos arredondados pelo sorriso espontâneo. Talvez sejas de um vermelho escuro de sangue e paixão oxidados pelo tempo. Ou, quem sabe, de um clássico preto, intemporal, memória das noites longas em que me conquistavas o mundo e eu partilhava contigo o sabor a sonho e a maresia de al berto. 
Nas tuas folhas encontrarei entranhado o cheiro a tabaco e o aroma adocicado da tua pele que formava uma barreira, sou capaz de jurar, quase invisível junto à minha. O assombroso cheiro dessas noites quentes em que te mantinha acordado para poder gravar as cores dos teus olhos. 
Páginas marcadas de frases curtas, dissecadas até ao osso. Algumas nascidas do ácido que nos corrói a esperança e nos doem como as cutículas que arrancamos, lentamente, em jeito de auto-punição. Outras mais doces que surgem das melodias que são também tu. E pelo meio as fotografias dos dias luminosos onde a possibilidade crescia nas pontas dos nossos dedos sem que a travássemos. 
Serás um livro de acabamentos irrepreensivelmente perfeitos, no entanto, absolutamente inútil. O futuro não se faz de cadáveres.

S.

2 comments: